No setor de transporte de veículos novos o menor preço parece não atrair a maioria das montadoras instaladas no país. O critério é bem diferente do adotado na hora de negociar com estados e municípios. A General Motor do Brasil, por exemplo, exigiu serviços públicos (abastecimento de água, energia elétrica, gás natural, gás de refinaria, telecomunicações, tratamento de efluentes industriais e sanitários) com custos internacionalmente competitivos para construir a unidade de Gravataí, no Rio Grande do Sul.
A expressão “internacionalmente competitivo”, referente a custos, não vale para escoar a produção. Os executivos da planta gaúcha chegam a pagar R$ 0,25 a mais para o cartel dos cegonheiros pelo quilômetro rodado. A diferença é de 49% sobre o valor de mercado. Os dados constam em notas fiscais obtida pelo site Livre Concorrência (confira). Aqui vale ressaltar que a empresa com menor custo só foi contratada por determinação da Justiça. A GM, e outros três réus, foram condenados em duas instâncias por formação de cartel no setor.

A lista de exigências encaminhada para estados e municípios não se limita aos serviços descritos acima. O site Livre Concorrência conseguiu nos arquivos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul a relação completa. O tom da conversa é muito diferente do usado para negociar com o cartel. A indústria sempre acata e se submete ao que transportadoras e sindicatos decidem para o segmento. O ônus dessa submissão é integralmente transferido para o bolso do consumidor.
O que a General Motors exigiu do Rio Grande do Sul e Gravataí
- Terreno de 3,5 milhões a 3,9 milhões de metros quadrados
- Arruamento pavimentado
- Instalação e ligação de gás natural ou de refinaria
- Instalação e ligação de energia elétrica
- Instalação e ligação de telefonia por fibra ótica
- Instalação de tratamento de efluentes até as instalações da GMB e fornecedores
- Instalação das linhas principais de efluente sanitários
- Garantir serviços de água, energia elétrica, gás natural, gás de refinaria, telecomunicações, tratamento de efluentes industriais e sanitários a um custo “internacionalmente competitivo”
- Restituir à GMB a totalidade do investimento realizado em ativos fixos
- Financiar capital de giro
- Diferimento do ICMS na compra de matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem. Diferimento significa transferir o lançamento e o pagamento do tributo para o momento da saída do produto final
- Viabilizar o pagamento de quaisquer importâncias devidas ao Estado com créditos de ICMS acumulados pela GMB e outros beneficiados. Isso vale inclusive para aquelas despesas decorrentes de fornecimento de obras e serviços realizados por empresas estatais
- Incentivos para realização de importações
- Construção completa de terminal para transporte marítimo e fluvial. A construção inclui canal de acesso de 17 pés de calado
- Viabilizar o transporte incentivado de veículos de Porto Alegre a São Paulo, bem como de Porto Alegre a Rio Grande
- Realizar melhoramentos e manutenção das rodovias a serem utilizadas para o transporte rodoviário, além de providenciar a construção de todos os acessos necessários ao complexo automotivo
- Terraplanagem e urbanização do terreno
- Recolhimento de lixo / Iluminação pública nas vias de acesso / segurança pública
- Transporte coletivo com reforço nos horários de entrada e saída dos empregados do complexo
- Isenção, por tempo determinado, de IPTU, ISS e de outras sete taxas municipais (lixo, alvará,etc.)
- Devolução de parte que é cabível à GM do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI)
- Conceder regimes especiais para simplificar o cumprimento de obrigações tributárias, conforme proposta apresentada pela GMB que estabeleçam controle tributário alternativo, eficaz e adequado.
A GM não está sozinha. A própria Volkswagen, em dezembro de 2018, recorreu à Justiça para denunciar ação do cartel para impedi-la de contratar “prestadores de serviços com melhores condições técnicas e financeiras”. Mais uma vez o cartel saiu vitorioso.