
Matéria modificada em 9 de fevereiro de 2022
Retratação: Vittorio Medioli não foi indiciado no inquérito policial 277/2010
José Carlos Rodrigues, conhecido como Pernambuco, confessou à Polícia Federal ter participado de um grupo contratado para incendiar caminhões-cegonha de transportadoras independentes – aquelas que não fazem parte do cartel dos cegonheiros e cujos operadores controlam mais de 90% dos fretes de veículos novos no país. Também revelou como ele e comparsas desenvolveram uma bomba mais eficiente e poderosa que o coquetel molotov. O explosivo garantia a queima total das cegonhas e de todos os carros embarcados. Por último, admitiu que a escalada da violência nas estradas não se limitaria a danos materiais. Segundo o delator, o grupo recebeu ordens para matar duas pessoas: Sandro, da Transilva, e o presidente do Sindicato dos Cegonheiros de Goiás (Sintrave-GO), Afonso Rodrigues de Carvalho, o Magayver.
Esses crimes (entre outros) foram apurados em inquérito (277/2010) aberto pela Polícia Federal. Seis anos depois de confessá-los, Rodrigues parece ter mudado de lado novamente e quer ser ouvido pelo desembargador Adilson Lamounier. O advogado dele, Rodrigo Ramos, também representa outros réus no processo: João Danilo Gomes Martins (João Serrano) e Tiago Gomes Martins (Tiago Serrano). Ninguém quer falar. Alegando que o processo tramita em segredo de Justiça.
O inquérito é o mesmo em que o político e empresário Vittorio Medioli, dono do grupo Sada e atual prefeito de Betim (MG), foi apontado de chefiar a quadrilha investigada. Os réus são acusados de associação criminosa e crimes contra a paz pública. Por conta do foro privilegiado a que teria direito o dono da Sada, o inquérito foi remetido ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em julho de 2017. Recentemente, os desembargadores (relator Adilson Lamounier) da 5ª Câmara Criminal do TJMG derrubaram o privilégio de Medioli, cuja defesa insiste em manter o inquérito no tribunal mineiro, mas vem perdendo os recursos. Segundo o magistrado-relator, “as condutas supostamente atribuídas ao investigado guardam nexo com a sua atividade empresarial e não foram cometidas no exercício do cargo de prefeito”. O processo será remetido para a Comarca de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, tão logo se esgotem os recursos.
Réu confesso
Além de confessar os crimes à PF, em 2013, Rodrigues também prestou depoimento ao juiz da 11ª Vara Criminal de Porto Alegre, com a presença do Ministério Público e assistido por um advogado. De novo reafirmou as declarações dadas à PF. Um dia depois, aceitou dar entrevista gravada ao site Anticartel (atual Livre Concorrência).
Sobre os incêndios, ele detalhou um dos ataques:
“Eu, o Waldélio (atual presidente do Sintraveic-ES), o Juscelino, o Zé Pedro, que era motorista nosso, o Cabelo, o Nenê, o Maurinho. Eram oito pessoas. Não estou lembrado do resto. Ficamos perto do pedágio. Fiz a bomba, com vários galãozinhos de gasolina. À meia-noite, a gente veio com dois carros. Durante o dia a gente tinha ido lá para ver como fazer. Eles (as vítimas) pararam a carreta de ré em um barranco. Quando foi meia-noite, a gente saiu. Paramos o carro no meio do mato, numa estradinha de chão. A gente desceu o barranco e tocou fogo em três carretas.”
Ele disse ter participado de três incêndios:
“Tem dois com coquetel molotov. Eu só dirigia. Tem um na BR-153 (Belém-Brasília), e o de Barreiras. Foram quatro caminhões. Participei da queima dos da Gabardo. Foram esses três.”
A respeito dos demais ataques, Rodrigues revelou:
“Aí saímos queimando carreta. Eu só iniciei. Teve muita ação que eu não fui, porque tinha meus compromissos.”
As ordens para queimar caminhões eram dadas por telefone:
“Pelo telefonema que ele (Tramontina) recebia. Ele dizia que o homem mandou nós viajar.”
Sobre o motivo que o levou a abandonar o grupo, explicou:
“Todas as vezes eu financiei, até Gilberto Portugal (da Brazul, já falecido) começar a bancar eles (o chamado grupo de ação), quando eu fui excluído. Eu fiquei fora também porque eles (o grupo de ação) decidiram eliminar duas pessoas: o Sandro, da Transilva, e o Magaiver. Eles falaram de morte, eliminar essas duas pessoas. Aí eu me afastei mais.”
Sobre a evolução das bombas, revelou:
“Nós começamos com coquetel molotov. Não deu certo, as carretas não queimavam o suficiente. Até descobrir a bomba.”
O delator montou e entregou à PF um protótipo da bomba usada nos incêndios criminosos (foto abaixo). No centro de cinco garrafas com capacidade para dois litros de gasolina cada uma, eles prendiam um detonador.

Expulsão de sindicato
Em assembléia realizada no início do mês de abril, o Sindicato dos Cegonheiros de Pernambuco (Sintraveic-PE) decidiu, por unanimidade, excluir dos seus quadros de filiados José Carlos Rodrigues, o Pernambuco. A alegação, segundo fontes ouvidas pelo site Livre Concorrência, é de que a permanência dele na entidade tornou-se inviável após a descoberta da participação dele em incêndios criminosos de caminhões-cegonha. Os demais associados rejeitam tais práticas. “Pernambuco” não quis falar com a Redação do site. O advogado que agora o defende, Rodrigo Ramos, limitou-se a informar que o caso está sob sigilo. Mesma informação foi repassada pelo procurador Steven Shuniti Zwicker.