
Agência reguladora – cujo papel funcional é exigir o cumprimento da lei – se nega a aplicar sanções legais em empresas condenadas pelo Cade por infrações à ordem econômica. Vibra, Ipiranga e Raízen obtiveram lucros estratosféricos, mas, por enquanto, foram colocadas acima da lei por serem “grandes demais”, tenta justificar a decisão da ANP.

Do Rio Grande do Sul
A denúncia feita pelo jornal Folha de São Paulo nesta semana continua repercutindo na imprensa. Segundo o jornal, a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) beneficiou as três gigantes do mercado de combustíveis – Vibra (ex-BR), Ipiranga e Raízen (Shell) ao não aplicar as sanções previstas no artigo 10 da lei 9.847/99, que prevê a revogação de autorização para o exercício de atividade por empresas que pratiquem infrações contra a ordem econômica reconhecidas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade. As três foram condenadas a pagamento de multas que somam R$ 174 milhões. A agência, no entanto, justifica que essas empresas “são grande demais para quebrarem”, e que a ação poderia promover desabastecimento, já que juntas, detém 65% do mercado.
Equipe de reportagem do site Livre Concorrência apurou que a Vibra Energia (antiga BR Distribuidora), uma das condenadas pelo Cade, teve um lucro líquido de R$ 1 bilhão no quarto semestre de 2021. A informação foi publicada pelo site Mais Retorno, em 23 de março deste ano. Já o Valor Econômico, no dia 15 deste mês, revela que a Vibra teve um lucro líquido de R$ 707 milhões no segundo trimestre de 2022. Uma alta de 65%.
No caso da Ipiranga, também condenada pelo Cade, a coluna Radar Econômico da Veja, ressaltou no dia 4 deste mês:
“A Ipiranga surfou na onda dos altos preços dos combustíveis e apresentou números robustos ao mercado. A rede de postos, que é comandada pela Ultrapar, viu as receitas saltarem para 33,7 bilhões de reais. no segundo trimestre de 2022. O lucro operacional do Ipiranga subiu quase 200% ao sair dos 209 milhões de reais, de igual período de 2021, para 591 milhões de reais.”
A Raízen, terceira gigante condenada no Cade, segundo revelou a Folha de São Paulo, obteve lucro líquido ajustado de R$ 1.086 bilhão no primeiro trimestre da safra 2022/2023, que terminou em 30 de junho. A informação, segundo o e-investidor do Estadão, foi transmitida pela própria empresa no dia 11 deste mês, após o fechamento do mercado. O resultado, ainda de acordo com o Estadão, “representa aumento de 120% ante igual período do ano anterior, quando a companhia lucrou R$ 501,4 milhões”. A edição é do dia 12 de agosto.
Desrespeito à lei
A ANP está desrespeitando – ao deixar de aplicar as penalidades nas empresas condenadas pelo Cade – o texto da lei 9.847/99, que está em vigor.
Em seu artigo 10º, é estabelecido:
“A penalidade de revogação de autorização para o exercício de atividade será aplicada quando a pessoa jurídica autorizada (V) – praticar, no exercício de atividade relacionada ao abastecimento nacional de combustíveis, infraçao da ordem econômica, reconhecida pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade ou por decisão judicial” (Inciso acrescido pela Lei nº 10.202, de 20/2/2001.).”
A reportagem fez contato com as assessorias de Imprensa da ANP e da Procuradoria Geral da República. A ANP solicitou mais prazo para responder aos questionamentos. A PGR não se manifestou.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil