
Matéria modificada em 9 de fevereiro de 2022
Retratação: Vittorio Medioli não foi indiciado no inquérito policial 277/2010
Em 23 de maio, seguindo recomendação do Ministério Público do Rio Grande do Sul, a juíza Cláudia Junqueira Sulzbach, da 11ª Vara Criminal de Porto Alegre (RS), rejeitou queixa-crime por calúnia e difamação movida por Vittorio Medioli contra o jornalista Ivens Carús, editor do site Livre Concorrência. Cinco dias depois, Medioli interpôs recurso contra a sentença que arquivou a acusação. A apelação do empresário e político de Minas Gerais contém matéria de site clandestino e informações falsas sobre as reportagens aqui publicadas.
Para o advogado Renato Dilly Campos, representante do dono do grupo Sada, o site trata Medioli de maneira pejorativa. Consta na apelação que Ivens Carús imputou ao recorrente (Vittorio Medioli) as seguintes condutas: associação à organização criminosa; conluio para impedir a Volkswagen de contratar novos operadores, formação de cartel (ou atuar de forma cartelizante) e “ter mandado um empregado realizar pagamento de R$ 1.500.000,00 ao recorrido para que parasse de publicar reportagens difamatórias”.
Medioli e seu representante também acusam o site de comercializar reportagens. Para tanto, apresentam trecho de uma gravação retirada de contexto. O material foi publicado em site clandestino que serve para atacar empresas, sindicalistas, parlamentares e jornalistas que ousam enfrentar o cartel dos cegonheiros. Vamos aos fatos.
Associação criminosa
Quem vinculou Medioli à prática de associação criminosa não foi o site Livre Concorrência. Inquérito aberto pela PF aponta o dono do grupo Sada de ser o chefe da organização criminosa que controla o mercado bilionário de transporte de veículos novos. O relatório final dessa investigação desvenda diversos ilícitos penais ocorridos no setor, inclusive incêndios criminosos em caminhões-cegonhas de transportadoras independentes – empresas sem vínculo com o cartel dos cegonheiros.
Formação de cartel
Também não foi o Livre Concorrência que ligou o empresário ao crime de formação de cartel. Em outra ação penal, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de São Bernardo do Campo indiciou Vittorio Medioli e mais 12 executivos de transportadoras e líderes sindicais e empresariais por formação de cartel, além de associação criminosa, lavagem de dinheiro, falsos documentais e tributários. O site só atualiza a movimentação do processo que tramitou, inclusive, no Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
Conluio para abortar contratação de novas transportadoras pela Volkswagen
Aqui vale recuperar o processo movido pela Volkswagen contra as empresas de Vittorio Medioli, a Tegma Gestão Logística, a Transauto e o Sindicato Nacional dos Cegonheiros (Sinaceg), no episódio que resultou no bloqueio por 15 dias da fábrica da marca alemã em São Bernardo do Campo. Confira o que os advogados da montadora escreveram:
“Sendo as corrés Transsauto, Tegma, Brazul, Transzero e Dacunha (as três últimas pertencem ao grupo Sada) os atuais prestadores de serviço de logística e transporte de veículos novos da Volkswagen Brasil (VWB), é evidente a sua atuação na paralisação, com o fito, mais uma vez, de pressionar a VWB a não realizar processo seletivo parta contratar novos prestadores de serviços com melhores condições técnicas e financeiras.”
Propina de R$ 1,5 milhão para depoimento fraudulento
Não é calúnia, tampouco difamação. São fatos confirmados por provas. A oferta de propina foi feita em 9 de fevereiro de 2015. O valor foi chancelada pelo vice-presidente do grupo Sada, Luiz Alberto de Castro Tito. Daí em diante, iniciaram-se as negociações sobre como seria feito o pagamento e o que Ivens Carús deveria dar em troca. Todos os diálogos e documentos produzidos entre março e setembro de 2015 (quando a transação cessou) foram entregues por Carús às autoridades (Ministério Público Federal, Gaeco e Polícia Federal).
Para receber a propina milionária, Carús deveria afirmar à Justiça que as empresas Transportes Gabardo, Transilva e Júlio Simões e o sindicalista Afonso Rodrigues de Carvalho patrocinavam as atividades do jornalista para publicar notícias contra os grupos Sada e Tegma.
Venda de matérias
Totalmente falsa a acusação contra o site Livre Concorrência. Medioli usa gravação veiculada em site clandestino especializado em detratar quem ousa desafiar o cartel dos cegonheiros. O veículo é considerado clandestino porque atenta contra o inciso IV, do artigo 5º da Constituição: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.” O site em questão é apócrifo.
Sobre a gravação, trata-se de áudio encaminhado por Carús, pelo aplicativo WhatsApp, ao presidente do Sintravers, Jefferson de Souza Casagrande. O áudio foi cortado e retirado de contexto.
O site não vende matéria
Medioli também usa depoimento dado pelo editor do site ao MPF de São Bernardo do Campo. Argumenta erroneamente que a receita lícita do site é utilizada para atacar sua honra, mas considera o site como um órgão de comunicação social de grande alcance.
Político tradicional avesso à oposição
Medioli é um político tradicional que não suporta conviver com a oposição. Antes de alegar que o site Livre Concorrência vende matérias, tentou impedir, por meio de medidas cautelares, que Carús exercesse a profissão de jornalista. O empresário, que se elegeu prefeito de Betim (MG) em 2016, solicitou à Justiça a “imediata suspensão da atividade de natureza econômica ou financeira” exercida pelo jornalista. A tentativa foi recusada pela própria Justiça em três oportunidades.
O advogado de Medioli termina a apelação de forma teatral. Ele escreveu:
“E não há dúvidas que o leitor deste tipo de reportagem verá o recorrente (Vittorio Medioli) como uma pessoa sem escrúpulos, talvez até como um criminoso. Excelências, vejam o prejuízo de ordem moral do qual o recorrente é vítima!”
Quem vê o cliente dele dessa maneira são os órgãos de investigação. As matérias do site Livre Concorrência baseiam-se em relatórios e inquéritos abertos e investigados pela Polícia Federal, Ministério Público Federal e Ministérios Públicos Estaduais.
Não há como omitir, também, que Medioli foi condenado na Justiça Federal de Minas Gerais por evasão de divisas. As apelações estão paradas no TRF-1, aguardando julgamento há quatro anos.