
Na continuação da entrevista exclusiva concedida ao site Livre Concorrência, o procurador Regional da República Lafayete Josué Petter destaca que até hoje as montadoras não adotaram as medidas necessárias para abrir o mercado de transporte de veículos novos. A concentração dos fretes nas mãos de poucos operadores causa prejuízo ao consumidor final. O sobrepreço no valor do serviço praticado pelo cartel dos cegonheiros é integralmente repassado ao consumidor final. A maior parte das marcas de automóveis resiste e se recusa a contratar transportadoras conforme critérios definidos pela livre concorrência. Foi só no segundo semestre de 2017 que o Cade pareceu ter mudado o foco do combate contra o cartel. Agora a investigação aberta pelo órgão antitruste em 2016 deslocou-se para as montadoras. Afinal, o cartel só existe porque as montadoras decidiram mantê-lo como prestador de serviços, à custa dos consumidores.
Por meio de ofícios datados de 27 de agosto, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) encaminhou a 16 montadoras instaladas no país um questionário para saber quais transportadoras atendem à indústria automobilística e quais regras balizaram o procedimento competitivo para contratá-las.
Petter acredita que com os dados fornecidos pelas fábricas, aliado ao trabalho desenvolvido pelos técnicos, a autoridade antitruste terá condições de avaliar criteriosamente qual o melhor caminho a seguir:
“A ideia que deverá prevalecer é a de acabar com o prejuízo ao consumidor final.”
Ele admite que a relação privada – montadoras, operadoras de logística e transportadoras – não necessita da interferência do poder público. Mas ressalta:
“Desde que não haja abuso.”
A partir da identificação do abuso do poder econômico, o representante do MPF defende a intervenção do Estado para garantir o exercício da livre concorrência e a defesa dos direitos do consumidor.
Sigilo das informações
Quanto ao fato de a maioria das montadoras apresentar respostas solicitando segredo das informações, o procurador regional se manifesta contrário, principalmente quanto ao nome das empresas responsáveis pelo escoamento da produção das fábricas:
“Não se justifica, uma vez que hoje em dia qualquer pessoa passa em frente de uma montadora e descobre quais as empresas estão realizando o transporte. Isso não pode ser considerado como informação sensível, capaz de garantir o seu sigilo.”
Para ele, o atual representante do MPF deve pedir ao Cade a decretação do fim do sigilo para esse tipo de informação.
Indagado a respeito de como o MPF pode auxiliar no combate a formação de cartel nesse setor, o representante ministerial alerta que qualquer unidade do órgão no país pode ser acionada por meio de denúncia ou notícia fundamentada. Os procuradores da área da defesa dos direitos do consumidor devem acompanhar principalmente os casos de aparente legalidade nas relações, mas que podem ferir a legislação em vigor. Também afirma:
“No caso dos cegonheiros, pelas notícias que são veiculadas, também existe uma competência penal a ser exercida.”
Competência estadual ou federal
Já nos casos de interpretação da competência da justiça Estadual e Federal (o que acaba atrasando as decisões judiciais) para processar e julgar ações de combate à formação de cartéis, Petter entende que esse tema há anos causa uma demora excessiva nas decisões, uma vez que a legislação não é suficientemente clara nesse aspecto. Ele anunciou que concluiu estudo sobre o caso, e que o resultado do trabalho deverá ser publicado em breve.